As cinco regras fundamentais para negociar com alguém cujo estilo de comunicação cultural é diferente do nosso.

Tim Carr, um americano que trabalha para uma empresa de defesa nos Estados Unidos, estava prestes a iniciar uma negociação sensível com um importante cliente saudita, mas não estava muito preocupado. Carr era um negociador experiente e bem treinado nos princípios básicos da negociação.

O telefonema para a Arábia Saudita decorreu de acordo com o plano. Cuidadosamente, Carr conduziu o potencial cliente a aceitar o contrato, e o objetivo parecia alcançado. Porém, depois de concluir uma recapitulação minuciosa de quem tinha concordado com o quê, foi brindado com um longo silêncio. Finalmente, ouviu uma voz firme, “Já lhe disse que o faria. Julga que não cumpro as minhas promessas? Que não tenho palavra?”

Foi o fim da discussão — e do contrato.

As muitas teorias existentes acerca da negociação podem funcionar perfeitamente quando estamos a negociar com uma empresa do nosso país. Mas aquilo que nos leva a obter um “sim” numa cultura, pode conduzir-nos a um “não” noutra.

Neste artigo, identifico as cinco regras fundamentais para negociar com alguém cujo estilo de comunicação cultural é diferente do nosso.

ADAPTE A SUA FORMA DE EXPRIMIR DESACORDO

Em algumas culturas é apropriado dizer “discordo totalmente” ou afirmar à outra parte que ela não tem razão; isto pode até ser considerado parte de uma discussão saudável. Noutras culturas, o mesmo comportamento provocará raiva e, possivelmente, uma quebra irremediável da relação.

A solução é procurar pistas verbais — especificamente, aquilo a que os linguistas chamam “upgraders” e “downgraders”. Os primeiros são aquelas palavras que podemos usar para enfatizar o nosso desacordo, como “totalmente”, “completamente” e “absolutamente”. Os segundos — “parcialmente”, “um pouco” e “talvez” — suavizam o desacordo. Russos, alemães, israelitas e holandeses usam muitos upgraders ao exprimirem desacordo. Mexicanos, tailandeses, peruanos e ganeses usam muitos downgraders.

Tente compreender a função dos upgraders e downgraders no seu próprio contexto cultural. Se estiver a negociar com um peruano e ele lhe disser que “discorda um pouco”, pode estar a preparar-se um problema sério. Mas se negoceia com um alemão que afirma “discordar completamente”, pode estar prestes a encetar um debate muito agradável.

PERCEBA QUANDO DEVE CONTER-SE E QUANDO DEVE TER DEMONSTRAÇÕES EMOCIONAIS

Em algumas culturas é comum, durante as negociações, levantar a voz quando está excitado, rir apaixonadamente ou tocar no braço da outra pessoa. Noutras culturas, todas essas demonstrações são vistas como falta de profissionalismo.

O que torna as negociações internacionais complicadas é que as pessoas de algumas culturas emocionalmente muito expressivas — como o Brasil, México e Arábia Saudita — podem também evitar exprimir abertamente o desacordo. Os mexicanos tendem a discordar de maneira suave, embora exprimam as emoções abertamente. Na Dinamarca, na Alemanha e na Holanda, o desacordo aberto é visto como positivo desde que expresso calma e factualmente.

A segunda regra das negociações internacionais é reconhecer o que uma efusão emocional pode significar na cultura com a qual está a negociar e adaptar-se de acordo com isso.

PERCEBA COMO A OUTRA CULTURA CONSTRÓI A CONFIANÇA

Durante uma negociação, ambas as partes estão a considerar explicitamente se o acordo beneficiará o seu próprio negócio e implicitamente a tentar avaliar se podem confiar na outra.

Aqui, as diferenças culturais podem ter grande impacto. A forma como começamos a confiar em alguém varia dramaticamente de uma parte do mundo para outra.

As investigações realizadas nesta área dividem a confiança em duas categorias: “cognitiva” e “afetiva”. A confiança cognitiva é baseada na confiança que sentimos nas realizações e capacidades de alguém. A afetiva provém de sentimentos de proximidade emocional, empatia ou amizade.

Na maioria dos mercados emergentes ou mais recentes, do Brasil e Índia ao sudeste asiático e África, há pouca probabilidade de os negociadores confiarem uns nos outros enquanto não se realizar uma conexão emocional. O mesmo é verdade para a maior parte do Médio Oriente e das culturas mediterrânicas. Isso pode tornar as negociações complicadas para os norte-americanos, australianos, britânicos e alemães, mais orientados para a tarefa.

Em certas culturas é necessário construir uma conexão emocional o mais cedo possível. Investir tempo em refeições e bebidas, e não falar de negócios durante essas atividades. Acabará por ter, além de um amigo, um contrato.

EVITE PERGUNTAS DE SIM OU NÃO

A certa altura, durante uma negociação, precisará de pôr uma proposta em cima da mesa — e descobrir se o outro lado a aceita. Um dos aspetos das negociações internacionais que causa mais confusões é que em algumas culturas a palavra “sim” pode ser usada quando o verdadeiro significado é não. Noutras culturas, o “não” é a resposta reflexa mais frequente, mas significa muitas vezes “Vamos discutir um pouco mais”. Em ambos os casos, interpretar mal a mensagem pode levar a um desperdício de tempo ou a um atraso sério.

Quando precisa de saber se a pessoa que está a negociar consigo vai fazer alguma coisa mas a sua resposta a todas as perguntas o deixa cada vez mais confuso, lembre-se da quarta regra das negociações interculturais: sempre que possível, evite colocar perguntas cuja resposta seja sim ou não. Se tiver de o fazer, ao negociar com o sudeste asiático, o Japão ou a Coreia, utilize todas as suas antenas emocionais. Mesmo que a resposta seja afirmativa, alguma coisa pode dar-lhe a sensação contrária: um silêncio um pouco mais prolongado, um longo reter de respiração. Se assim for, é provável que o acordo não esteja selado.

TENHA CUIDADO AO PÔR AS COISAS POR ESCRITO

Os gestores americanos aprendem a repetir mensagens-chave e a recapitular uma reunião por escrito. Também no norte da Europa a clareza e a repetição são a base de uma negociação eficaz. Mas esta boa prática pode sugerir falta de confiança em negociações com África ou Ásia.

A diferença de abordagem pode dificultar a redação de um contrato. Os americanos confiam muito nos contratos escritos, mas em países onde o sistema legal é tradicionalmente de menor confiança e as relações têm um peso maior nos negócios, os contratos escritos são menos frequentes. Nesses países os contratos representam muitas vezes um compromisso de fazer o negócio, mas não são legalmente vinculativos. Assim, são menos minuciosos e menos importantes.

A quinta e última regra para negociações internacionais é proceder com prudência em relação ao contrato. Peça à outra parte para redigir a primeira versão, para perceber com quantos pormenores eles planeiam comprometer-se antes de lhes pôr à frente um documento de vinte páginas. E esteja preparado para fazer revisões. Quando negociar em mercados emergentes, lembre-se de que tudo nesses países é dinâmico, e que nenhum contrato é 100% definitivo.

Finalmente, é preciso não esquecer as regras universais: ao negociar um acordo, precisamos de persuadir e reagir, de convencer e esquivar, fazendo valer os nossos argumentos durante o processo. No calor da discussão, aquilo que se diz é importante. Mas a confiança que terá construído e a sua capacidade para adaptar o seu comportamento ao contexto, acabarão por fazer a diferença entre o sucesso e o fracasso.

Resumo da Ideia

O PROBLEMA: Nas negociações com países diferentes, os gestores descobrem muitas vezes que acordos perfeitamente racionais acabam por se desfazer quando as pessoas com quem negoceiam fazem exigências aparentemente irracionais ou não respeitam os seus compromissos.

A RAZÃO POR QUE ACONTECE: Cada cultura tem as suas próprias normas de comunicação e, ao longo do tempo, apercebemo-nos de que o que numa cultura nos conduz a um “sim”, noutra cultura pode conduzir-nos a um “não”.

A SOLUÇÃO: Pode reduzir os problemas de comunicação respeitando estas cinco regras fundamentais:

  • Perceba como deve exprimir o desacordo.
  • Reconheça o significado da expressividade emocional.
  • Aprenda a forma como a outra cultura constrói a confiança.
  • Evite perguntas de sim ou não.
  • Tenha cuidado ao pôr as coisas por escrito.

Em Busca de Pontes Culturais

Nada pode substituir a capacidade de aprender tudo o que for possível acerca da cultura com que vai negociar. Mas arranjar uma ponte cultural — alguém que seja da outra cultura, que pertença a ambas as culturas ou que, pelo menos, tenha uma experiência forte relativamente ao outro — que vá consigo para a mesa de negociações pode dar-lhe uma boa vantagem.

Claro que, se uma das partes não falar bem a sua língua, é comum ter a ajuda de um intérprete, mas uma ponte cultural pode causar um grande impacto se não houver divisões linguísticas. Durante os intervalos, por exemplo, pode pedir a essa pessoa que lhe explique o que se vai passando nas entrelinhas.

A executiva inglesa Sarah Stevens estava a dirigir uma equipa de americanos durante uma negociação no Japão. As partes japonesas falavam todas bem inglês, mas três horas depois do início da negociação Stevens percebeu que a sua equipa estava a falar 90% do tempo, o que a deixou preocupada. Pediu conselho a um funcionário do escritório da empresa no Japão e este explicou-lhe que os japoneses param frequentemente para pensar antes de falarem — e que para eles o silêncio não é desconfortável como é para os americanos ou britânicos. O colega aconselhou Stevens a adotar a abordagem japonesa: depois de colocar uma questão, aguardar em silêncio e pacientemente por uma resposta. Também lhe disse que os japoneses muitas vezes tomam decisões em grupo, pelo que podiam precisar de conferenciar antes de darem uma resposta. Se após um período de silêncio não houvesse uma resposta clara, Stevens devia sugerir um pequeno intervalo para poderem ter uma conversa privada.

Explicou-lhe que no Japão era comum resolver uma série de conflitos potenciais em conversas informais de um para um antes do encontro formal do grupo, que é visto mais como um lugar para selar decisões que já foram tomadas. Esta informação já chegou tarde para aquela viagem, mas Stevens teve o cuidado de, na vez seguinte, permitir discussões informais prévias. Graças à sua ponte cultural, obteve o acordo que esperava.

Se a sua equipa não tem um candidato óbvio para este papel, procure entre outros funcionários da empresa. Mas não cometa o erro comum de pensar que alguém que fala a língua e tem um familiar da cultura em questão vai necessariamente ser uma boa ponte cultural.

Consideremos um gestor inglês de origem coreana: ele tinha o aspeto de um coreano, tinha um nome coreano e falava a língua sem sotaque, mas nunca vivera nem trabalhara na Coreia; os seus pais tinham emigrado para Inglaterra quando eram adolescentes. A sua empresa pediu-lhe que ajudasse numa importante negociação que decorreria na Coreia, mas quando lá chegou percebeu rapidamente que a sua equipa se teria saído melhor sem ele. Como falava tão bem a língua, os coreanos partiam do princípio de que se comportaria como um deles, e ficavam ofendidos quando ele falava com a pessoa errada na sala ou quando os confrontava demasiado diretamente.

Como ele observa, “Se eu não parecesse tão coreano, eles ter-me-iam perdoado o mau comportamento-

Fonte: Dinheiro Vivo

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