O valor surgiu nas discussões com a troika em Setembro para compensar a queda nas receitas e a devolução de um salário aos funcionários e pensionistas.

O número começou a circular em reuniões entre o Governo e os parceiros sociais em meados de Setembro do ano passado, após o quinto exame regular da troika. Nos primeiros dias, os relatos que chegavam às redacções sobre essa informação que veio a marcar os meses seguintes não tiveram destaque nas páginas dos jornais. A razão é simples: depois de dois anos de austeridade, aplicar um corte de quatro mil milhões de euros adicional à despesa parecia algo pouco credível – tratava-se de cortar 5% em termos nominais de um momento para o outro. A confirmação demorou poucos dias a chegar, pela boca dos líderes das confederações patronais e sindicais.

No final de Setembro, já depois da polémica que forçou o recuo na TSU a marcar a agenda, a decisão de avançar com um corte de 4 mil milhões de euros em 2014 e 2015 era já um dado adquirido, embora ainda não admitido pelo Executivo. As derrapagens na receita causadas pela recessão interna maior do que o esperado e a inconstitucionalidade dos cortes salariais da função pública e nos pensionistas criaram a necessidade de medidas adicionais. Segundo a troika: cortes de 4 mil milhões de euros do lado da despesa.

O plano do Governo e da troika passava assim por compensar em 2014 os cortes salariais que deixaram de ser possíveis em 2013 e, eventualmente, se a economia crescesse, conseguir ainda reverter uma parte do “enorme” aumento de impostos já então decidido para este ano. Em causa estava também a meta de um ajustamento baseado em dois terços do lado da despesa, preferencialmente com cortes na despesa corrente para que algum investimento público pudesse regressar a prazo.

A decisão de avançar com uma reforma do Estado ainda não tinha sido tornada pública por esta altura, embora estivesse já tomada, dada a dimensão dos cortes em causa.

No relatório da quinta avaliação do FMI, terminada no início de Setembro, mas cujo texto foi tornado público em meados de Outubro, lê-se que o “staff vincou que cortes adicionais permanentes a grandes transferências sociais facilitariam o progresso para os objectivos orçamentais de médio prazo”, mas que “as autoridades disseram ser difícil encontrar cortes adicionais nesta fase”. E assim ficou marcada uma discussão com a troika em Novembro sobre uma “avaliação da despesa” com vista à apresentação de uma proposta de cortes concretos em Fevereiro.

A associação da reforma do Estado aos quatro mil milhões de euros só ganhou forma num discurso de Passos Coelho no final de Outubro em defesa do que chamou uma “refundação” do memorando da troika, uma ideia que entretanto ajustou para a “refundação” do Estado social – teve aí início assim o maior embate político com a oposição do programa de ajustamento, com um desfecho que ainda não é claro.

Fonte: Jornal de Negócios

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