Casou-se ou divorciou-se recentemente? O seu filho ultrapassou os 25 anos e deixou de ser seu dependente para efeitos fiscais mas não deu nota disso à empresa em que trabalha? Então integra muito provavelmente as situações de divergência entre a situação familiar e a taxa de retenção na fonte do IRS que foram detetadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira, tutelada por Paulo Núncio. Estes casos levaram o fisco a enviar avisos a cerca de 400 mil empresas para que estas verifiquem se têm os dados familiares dos trabalhadores atualizados e se estão a fazer a retenção pela tabela e taxa corretas. Em caso de desconformidade, poderá ter de ser feita uma correção dos valores retidos com efeitos a partir de janeiro.

O reforço dos meios que permitem cruzar dados e a revogação da opção que permitia a alguns casais fazer a retenção na fonte como “casado único titular” (ainda que ambos auferissem rendimentos sujeitos a IRS) foram os elementos que estiveram na origem deste maior controlo do fisco sobre as retenções na fonte. O objetivo é eliminar os casos em que este desconto mensal é inferior ao que deveria ser feito se a situação familiar estivesse correta.

É que o valor retido todos os meses por via do IRS tem em conta não apenas o montante de remunerações mas também o número de dependentes do trabalhador, se este é ou não casado e se, sendo, o outro cônjuge também recebe um salário ou uma pensão. Exemplificando: dois trabalhadores que ganhem por mês 1700 euros ilíquidos descontam 14,5% de IRS por mês ou 21,5% consoante se trate de um “casado, único titular” ou de um “casado, dois titulares”, respetivamente. A taxa é mais baixa para ambos os casos, quando haja dependentes.

Nos “alertas informativos” que chegaram às 400 mil empresas que fazem retenções na fonte, a AT avisa que “implementou um rigoroso sistema de controlo eletrónico” dos valores retidos face à situação de cada trabalhador, recomendando às empresas que “confirmem junto dos seus trabalhadores o número de dependentes, situação conjugal e se o outro cônjuge recebe ou não rendimentos das categorias A e H.

O fisco avisa ainda que as incorreções ou divergências “constituem uma infração fiscal” que pode ser sujeita a uma coima entre os 3750 e os 22 500 euros. E quem é o responsável pelo pagamento desta multa? Tudo depende “da situação em concreto”, diz fonte oficial das Finanças. Seja como for, até agora não há registo da aplicação deste tipo de coimas. Ainda assim, perante a nova atuação da AT e tendo em conta que cabe ao sujeito passivo informar a entidade empregadora de alterações na sua situação familiar para efeitos fiscais, Paula Franco, consultora da Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas (OTOC), aconselha os trabalhadores a cumprirem esta formalidade. Ao mesmo tempo, tem sido reforçada a mensagem junto dos TOC para que estes avisem as empresas da necessidade de terem o cadastro dos trabalhadores em dia. Ao que foi possível apurar, alguns organismos públicos como escolas, universidades e hospitais, também estão a proceder a esta atualização.

Outro dos fiscalistas contactados pelo Dinheiro Vivo observa que numa altura em que a AT manda e-mails aos contribuintes pelos mais variados motivos, poderia também usar esse canal de comunicação para o informar da necessidade de terem a sua situação em dia junto da empresa onde trabalham.

Para já, a intenção da AT é “promover o cumprimento voluntário das obrigações”, mas passada esta fase de avisos e caso as divergências persistam, serão “desencadeados os procedimentos que se afigurem necessários e adequados” – leia-se aplicação de coimas.

Nestes alertas, a AT “recomenda” ainda às empresas que efetuem “as correções no valor do imposto retido” com efeitos a janeiro. Esta recomendação visa sobretudo os casais em que um dos elementos ganha mais de 95% do agregado e que até 2014 podiam pedir para fazer a retenção como “único titular”. Esta opção foi revogada com a entrada em vigor da reforma do IRS que veio estabelecer como regime-regra o da tributação em separado, aceitando como exceção apenas os casos em que um dos cônjuges aufere exclusivamente rendimentos prediais ou de capitais, ou quando recebe subsídio de desemprego. Estes casos são facilmente detetados pela AT, porque cruzam a retenção com a declaração do IRS que tem na sua posse.

Mas o efeito na folha salarial do trabalhador é grande. Pode significar, no caso de uma salário a rondar os 1800 euros, a subida do valor da retenção mensal de 270 euros (desconto para o casado, único titular) para 387 euros (como casado, dois titulares). Se o acerto tiver de retroagir a janeiro, a situação destes contribuintes fica ainda mais complicada.

Fonte: Dinheiro Vivo

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