Uma simples bola pode levar luz a 1,4 mil milhões de pessoas sem electricidade: 15 minutos chegam para alimentar um gerador a pontapé

Há sete anos, na aproximação ao Mundial de 2006, a FIFA quantificou em mais de 265 milhões o número de futebolistas profissionais no planeta – cerca de 4% da população mundial. A estes juntar-se-ão um igual número de cidadãos comuns que têm no pontapear de uma bola o seu passatempo de eleição. E se fosse possível armazenar a energia de cada chuto dado numa bola? Essa foi a ideia de quatro ex–alunas da Universidade de Harvard, que chegaram a uma bola que armazena electricidade para se ter luz por mais de três horas em apenas 15 minutos.

Produzir energia a pontapear uma bola de futebol é o projecto que hoje já depende dos pés de milhares de crianças no Brasil, no México, na África do Sul ou em El Salvador, quatro dos sete países que já acolhem a iniciativa. O seu nome é Soccket e veio da cabeça das quatro ex-alunas da Universidade de Harvard, nos EUA. Em 2008, um trabalho académico desafiou-as a criar um jogo para vários pessoas em simultâneo e que abordasse uma problemática de desenvolvimento. Daí surgiu a ideia de unir duas coisas abundantes no mundo: “Combinaram o amor pelo futebol com a necessidade de electricidade”, resumiu Alison Dalton Smith, responsável pela comunicação da Uncharted Play, empresa que cresceu com o projecto.

A ideia tem um potencial global, mas começou por ser restrita a campos mais pobres. Das quatro criadoras do projecto, duas, Julia Silverman e Jessica Matthews, têm raízes e experiências de vida em África, onde habitam grande parte dos 1,4 mil milhões de pessoas do planeta que vivem sem acesso a electricidade. Aqui reside o alvo para onde a Soccket começou por ser chutada. “Com 15 minutos de futebol, as crianças pobres vão ter luz para lerem à noite, limparem a água e organizarem a sua comida convenientemente”, dizia Mattews em 2011, ao lado de Bill Clinton, numa conferência sobre inovação organizada pela fundação do antigo presidente norte-americano. “Não se trata só de resolver o problema da energia, mas de o resolver de uma forma divertida”, resumiu.

Mas o que é, ao certo, esta Soccket? É uma bola de futebol com 481 gramas de peso, com um mecanismo no seu interior que “gira com a rotação da bola” e aproveita o movimento para gerar energia cinética, “convertendo-a em electricidade e armazenando-a numa bateria [recarregável]”. O resto obedece à norma: a Soccket tem o mesmo tamanho que uma bola de futebol profissional, a troco de apenas mais 56 gramas de peso em relação à última bola fabricada pela Adidas, a Tango, que foi utilizada em 2012, no último Europeu de futebol. Com a bola parada, é só ligar um candeeiro especial a uma entrada para usufruir dos seus 6 watts de potência.

Ser um gerador portátil de energia não é a única diferença que a separa das bolas de futebol convencionais. A Soccket é feita com espuma de borracha, um material mais resistente e duradouro, escolhido para aguentar ruas esburacadas e campos de terra, espaços onde milhões de crianças africanas e sul-americanas mais pobres a vão utilizar. “Já distribuímos mais de 2500 bolas em sete países, como o Brasil, o México, a África do Sul e El Salvador”, conta Alison Smith, antes de acrescentar a Argentina, o Haiti e a Nicarágua como alguns dos próximos locais a receber a Soccket.

Voltamos às contas do apito inicial deste texto. E o futebol profissional? Será viável um dia a Soccket produzir electricidade nos pés de quase 300 milhões de futebolistas? “Não me parece descabido. À medida que a tecnologia evoluir e o nosso negócio se expandir, vamos tentar tornar esta tecnologia melhor e mais barata”, analisou. Para já, a empresa estima que a bola comece a ser vendida por um valor a rondar os 150 dólares (117 euros).

Fonte: Jornal i

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