Austeridade empurra islandeses para governo de centro–direita, apontado como responsável pela crise de 2008.

Nos últimos dois anos, a Islândia tem servido como arma de arremesso ideológico, representando uma alternativa de saída da crise, por parte de um país que, estando fora da Zona Euro, pode utilizar a desvalorização da sua moeda como estratégia, evitando medidas de austeridade mais agressivas. No entanto, a mesma história tem diferentes narrativas. A maior prova disso mesmo foi o resultado das eleições legislativas deste fim-de-semana, que ditaram a saída do poder do Governo responsável pelo “milagre islandês”.

“Em grande parte a Islândia recuperou”, explica ao Negócios Silja Bára Ómarsdóttir, professora na Faculdade de Ciência Política da Universidade de Reykjavík. “Gastaram 200 mil milhões de coroas islandesas

[1,3 mil milhões de euros] para reduzir o endividamento das famílias, desceram a inflação e o desemprego, quase eliminaram o défice orçamental e defenderam o Estado social.”

Durante o colapso do sistema financeiro islandês em 2007/2008, o Governo optou por deixar falir e nacionalizar a banca, permitiu que a sua moeda desvalorizasse 80% e impôs fortes controlos de capital que ainda estão hoje no terreno. O que se seguiu foi uma depressão grave: recessão de quase 7%, desemprego mais que duplica num só ano e aproximou-se dos 20%.

Contudo, a pequena economia acabaria por ajustar, com uma contracção acelerada do sector financeira e da construção. O Governo concedeu perdões a proprietários com dívidas superiores a 110% do valor da sua casa e alívios nos juros, especialmente dirigidos a quem ganhasse menos ou tivessem filhos.

Os resultados começaram a surgir em 2011, com um regresso ao crescimento económico (2,6%) que se manteve em 2012 (2,3%), uma descida da taxa de desemprego (hoje, nos 6%) e uma maior estabilização da inflação (próxima dos 4%). A Islândia conseguiu pagar os empréstimos do FMI antes de tempo e recuperou o rating de investimento.

Então o que levou os islandeses a expulsar este Executivo aparentemente bem sucedido, voltando a colocar no poder a coligação de centro direita que governou o país entre 1995 e 2007, tidos com responsáveis pela crise financeira? “O Governo que está de saída fez um trabalho muito mau a promover os seus sucessos domésticos”, sublinha Ómarsdóttir. “A percepção do público é que a economia não está tão vibrante como deveria estar.”

De facto, e apesar dos avanços, o Governo teve de aumentar impostos e cortar na despesa, o desemprego continua a ser quase três vezes mais elevado do que era antes da crise, a dívida das famílias explodiu, assim como os preços de bens e serviços (a desvalorização cambial tornou as importações mais caras).

Tanto o Partido da Independência (26,5% dos votos) como o Partido Progressista (22%) basearam a sua campanha num afastamento da austeridade, do FMI e, talvez mais importante, de uma possível adesão à União Europeia, uma ideia rejeitada por dois em cada três islandeses.

Fonte: Negócios

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