Até ao final de 2016 prevê-se que seja elaborado e apresentado ao Governo um projeto de transposição da Diretiva 104/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho de 26 de Novembro.

Esta estabelece a possibilidade de o Estado, ou qualquer entidade paraestatal, empresa ou particular intentar uma ação de indemnização nos tribunais nacionais contra os operadores de mercado que pratiquem medidas anti concorrenciais, com o objetivo de ver ressarcidos os danos sofridos em virtude da violação das regras da concorrência.

A adoção de práticas restritivas da concorrência (cartéis, fixação de preços, repartição de mercados) pode conduzir a um aumento dos preços no mercado, o que afeta os clientes das empresas que adotem estes comportamentos. Por outro lado, podem ainda refletir-se junto dos fornecedores, quando a empresa infratora adquire os seus produtos a um preço mais baixo do que aquele que efetivamente deveria pagar.

Paralelamente, o abuso de posição dominante, que decorre da prática de preços predatórios, acordos de exclusividade verticais ou vendas subordinadas, levam à exclusão dos operadores no mercado e à diminuição das suas quotas e margens de lucro, bem como a perda de oportunidades comerciais, aumento dos preços e ainda redução da qualidade e inovação nos produtos, prejudicando o funcionamento do mercado em geral e os interesses dos consumidores em particular.

Em Portugal, a fiscalização sobre estas matérias é feita pela Autoridade da Concorrência, que atua como entidade reguladora com poderes de imposição de coimas que podem atingir os 10% do volume de negócios das empresas. De acordo com o plano de ações para este ano, esta entidade deverá apresentar ao Governo, para posterior discussão e aprovação no Parlamento, o projeto-lei que levará à transposição da Diretiva. Com a transposição, será possível a qualquer pessoa singular ou coletiva, vítima da adoção de práticas anti concorrenciais por parte de outros operadores no mercado, pedir uma indemnização por danos emergentes ou lucros cessantes por si sofridos, bem como o pagamento de juros.

Finalmente, prevê ainda a possibilidade de os litígios resultantes das infrações concorrenciais serem dirimidos pela via amigável. Tal pretende encorajar as partes envolvidas a solucionar estas questões recorrendo às vias extrajudiciais como a mediação e a arbitragem. Desta forma, é expectável que as questões da concorrência e a arbitragem se cruzem no mesmo caminho, quando as partes decidam com recurso a uma cláusula arbitral prévia, reconduzir a resolução dos seus litígios por esta via mais expedita.

A transposição da Diretiva constitui um passo importante no sentido da adoção de medidas que pretendem fazer face a comportamentos anti concorrenciais, que estão também ligados à adoção de condutas pouco éticas no seio das organizações e ao não cumprimento estrito dos normativos legais e regulatórios a que estas estão obrigadas.

Não obstante, a empresa ou particular lesado no âmbito destas práticas, terá de provar e fundamentar o pedido de indemnização, recorrendo a métodos, modelos económicos e financeiros, que possam estimar a evolução do mercado num cenário sem infração, tendo em conta as características das várias empresas, dos seus mercados em termos geográficos e de produto, assim como o seu desempenho financeiro, implicando uma análise complexa dos factos e dados económicos em causa.

A questão estará em determinar o montante da indemnização requerida, isto é, quantificar e provar os danos resultantes das práticas concertadas ou de abuso de posição dominante por parte de poderosos concorrentes. Estas infrações envolvem um conjunto de variáveis económico-financeiras, como cash-flows, preços, margens de lucro e volume de vendas, entre outros, que podem ter um impacto negativo no negócio das empresas afetadas e que nem sempre são evidentes e de fácil quantificação. Por esta razão e à semelhança do que se tem vindo a assistir noutras geografias, o recurso a técnicos credenciados e especializados neste tipo de exercício de quantificação, muitas vezes com recurso a equipas multidisciplinares e nalguns casos internacionais, será seguramente uma necessidade imperativa das partes. A realização de quantificação dos danos requer um nível de exigência técnico, explanatório e demonstrativo rigoroso e elevado, sob pena de as entidades competentes chamadas a dirimir os temas em disputa não conseguirem alcançar toda a complexidade e impacto dos mesmos.

Após a transposição da Diretiva, os operadores poderão deparar-se com importantes vantagens, se forem corretamente suportados e apoiados na fundamentação e quantificação dos danos e, também, no recurso aos meios de resolução extrajudicial dos litígios resultantes da verificação de comportamentos anti concorrenciais no mercado.

Fonte: Económico

Comentários

comentários