Um ano após a OPEP ter aberto as torneiras, o cartel toma sexta-feira mais uma decisão que terá efeitos em todo o mundo. O que vem aí? Petróleo mais caro ou (muito) mais barato?
Os preços do petróleo estão há um ano em crash. Um crash que não aconteceu por acaso. Pelo contrário, explica-se por uma estratégia do cartel da OPEP para tentar depenar os produtores norte-americanos – os mesmos que estão a ajudar os EUA a tornarem-se autónomos do ponto de vista energético. Há um ano que o mundo vive uma guerra de preços, que tem dado petróleo barato a todo o mundo, e chegamosesta sexta-feira ao momento decisivo em que a OPEP faz uma de duas coisas: ou mantém as torneiras abertas e arrisca levar o petróleo para 20 dólares ou, em alternativa, cede à pressão interna e externa e dá um passo atrás, reduzindo a produção. E, aí, é impossível dizer quanto o petróleo pode subir.
O barril do petróleo oscilava em torno dos 100 dólares por barril no verão de 2014. Começou, por essa altura, a deslizar, penalizado pelos receios em relação à evolução da procura por parte de uma China em desaceleração. Em novembro de 2014, quando os especialistas esperavam um corte da produção para ajustar à menor procura, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) tomou uma decisão histórica que faria o preço do petróleo cair para menos de metade: manteve as quotas inalteradas, enviando um sinal forte ao mercado de que o cartel preferia sacrificar os preçosem prol da conservação da posição no mercado.
É que, nessa altura, seguiam de vento em popa osnovos projetos de exploração através do fracking do petróleo e gás de xisto, essencialmente nos EUA, que há alguns anos vinham mordiscando as quotas de mercado da OPEP. Estes projetos têm um custo de exploração mais elevado e, na maioria dos casos, trata-se de projetos financiados com base em pressupostos que colocam em causa a sua viabilidade numa situação de preços demasiado baixos por demasiado tempo. Por outras palavras, o objetivo da OPEP é não só levar estes projetos à falência mas, também,traumatizar os bancos que os financiaram para que, tão cedo, não queiram meter-se noutra.
Ao Observador, Ole Hansen, chefe da estratégia em matérias-primas do Saxo Bank, diz que “a OPEP já admitiu, mais ou menos, que quer reconquistar a quota de mercado que perdeu, sobretudo, para os produtores de petróleo/gás de xisto que cresceram durante a era do petróleo a mais de 100 dólares por barril”. “É bastante claro que o forte aumento da produção norte-americana entre 2011 e 2014 reduziu a capacidade da OPEP de manipular o preço do petróleo mundial e, tendo em conta os seus custos de produção mais baixos, olharam para esta queda dos preços como umsofrimento de curto prazo em prol de um ganho a longo prazo“, explica o especialista.
Decisão da OPEP, há um ano, fez afundar os preços do petróleo
Um ano depois dessa decisão histórica, o petróleo não para de cair e chegou a ser negociado abaixo de 40 dólares por barril esta semana (em Nova Iorque). Sabe-se que há membros da OPEP a produzir mais do que o combinado, para tentar obter mais receita, e há relatos de petroleiros carregados de petróleo barato e que estão a servir não de meio de transporte mas de local de armazenamento, à espera de dias melhores.
Dias melhores que só virão se a OPEP decidir, esta sexta-feira, 4 de dezembro, reduzir a produção. No mínimo, quem quer ver o preço mais alto espera, pelo menos, que a OPEP acomode a chegada do petróleo iraniano que passou, com o levantamento das sanções, a poder ser comercializado nos mercados internacionais. Mas é possível que faça mais do que isso e, aí, o petróleo, cujo preço baixo tem sido um dos impulsionadores da economia portuguesa, pode voltar a tornar-se mais caro.
A forte quebra dos preços do petróleo tem dado um impulso à economia portuguesa, de um modo geral, um efeito que só não é mais sentido – nomeadamente nas bombas de combustível – porque o euro tem perdido valor face ao dólar, a divisa em que são negociados o petróleo e os produtos derivados.
“A estratégia está a ter um sucesso limitado”, diz Ole Hansen
É certo que, como lhe mostrámos recentemente neste gráfico, parou a escalada da produção norte-americana de crude. Mas, “até ao momento, a estratégia está a ter um sucesso limitado“, diz o responsável pela estratégia do Saxo Bank em matérias-primas. Ole Hansen parece ver alguma razão no alerta feito por Igor Sechin, presidente da petrolífera russa OAO Rosneft, que recentemente afirmou: “A estratégia que a Arábia Saudita escolheu não traz quaisquer vitórias significativas. Pelo contrário, provavelmente”.
O especialista do Saxo Bank diz que “tem havido um abrandamento da produção não-OPEP, especialmente nos EUA onde a produção caiu cerca de 500 mil barris por dia desde os máximos fixados no início deste ano”. “Mas a resiliência dos produtores norte-americanos está a surpreender o cartel, obrigando os países da OPEP a sofrer com preços baixos durante mais tempo”, explica Ole Hansen.
E o que explica essa “resiliência” dos produtores norte-americanos? A resposta poderá estar não na economia mas na finança. Como notou John Lizard, um colunista do Financial Times, logo no final do ano passado, o ambiente de taxas de juro baixas está a permitir que os financiadores destes projetos nos EUA sejam mais tolerantes com a inviabilidade atual destes negócios. A dívida está a acumular-se, avisa John Lizard, mas devido às taxas de juro baixas e à expectativa de que os preços do petróleo irão subir, eventualmente, o que é facto é que a maioria dos projetos continuam de pé.
“A resiliência dos produtores norte-americanos está a surpreender o cartel, obrigando os países da OPEP a sofrer com preços baixos durante mais tempo” – Ole Hansen, responsável pela estratégia em matérias-primas do Saxo Bank
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