O calendário de implementação e o lote mínimo são os pontos em aberto nas negociações, que acabam a 13 de Janeiro. O autarca de Melgaço acusa a comissão dos vinhos verdes de defender “os interesses das grandes empresas”.

Está muito próxima a “solução de consenso” que o Ministério da Agricultura pediu para o polémico alargamento a toda a região da possibilidade de comercializar vinhos verdes da casta alvarinho, que continua a ser um exclusivo das sub-regiões de Melgaço e Monção. O acordo deverá ficar selado na terceira e última ronda negocial do grupo de trabalho, agendada para terça-feira, 13 de Janeiro, em Arcos de Valdevez. Até ao final do mês, o Governo terá de comunicar a Bruxelas – que pedira esclarecimentos – a alteração da lei ou justificar a compatibilidade da actual legislação com o direito comunitário.

À partida para o derradeiro encontro do grupo de trabalho, que juntou dez empresas desta região vitinícola com posições distintas sobre o problema – com a supervisão do vice-presidente do Instituto da Vinha e do Vinho (IVV), Toscano Rico – já está acertado que os produtos de Melgaço e Monção poderão diferenciar-se no rótulo, sendo designado “alvarinho premium”. Já há acordo também para permitir que lotes de alvarinho da sub-região sejam lotados com castas da restante região sem perder a possibilidade de usar a casta na rotulagem. Haverá ainda um envelope financeiro para investir  na promoção dos vinhos destes dois concelhos do Alto Minho.

Porém, há três pontos por fechar. O mais relevante é o calendário de implementação. É que se é pacífico que algumas alterações entrem em vigor já em 2015, outras terão um período gradual de aplicação. Os defensores do alargamento concedem que ele não seja inferior a quatro anos, enquanto os representantes da sub-região pretendem um período transitório mais longo até que os restantes colegas possam produzir alvarinho com DO (denominação de origem) 100% a partir das suas uvas.

Está também em discussão a percentagem do lote mínimo, sendo que as propostas em discussão apontam para valores entre 20% e 50%. Isto é, para mencionar alvarinho, os lotes devem ter uma percentagem mínima desta casta, valorizando assim o lote e a casta e não levando o consumidor ao engano, uma norma a aplicar de igual forma aos DO e IG (indicação geográfica), terminando a discrepância actual. O terceiro ponto em aberto tem sido uma reivindicação da adega de Monção, que quer que as uvas da sub-região sejam ali vinificadas em exclusivo.

Em causa neste diferendo está “apenas” a possibilidade de todas as empresas da região mencionarem a casta, isto é, rotular Vinho Verde Alvarinho. O plantio desta casta é livre em toda a União Europeia, incluindo todo o território nacional.  Aliás, em todas as restantes regiões portuguesas, exceptuando a Bairrada e o Algarve, é permitido produzir e rotular alvarinho nos vinhos com Denominação de Origem.

No caso dos vinhos verdes, porém, a menção da casta no rótulo só é possível em Monção e Melgaço, enquanto nos restantes 35 concelhos a casta é plantada e vinificada, – há 500 hectares com esta planta fora dos dois concelhos -, mas não pode ser mencionada no rótulo. Ou seja, embora o vinho seja 100% alvarinho, se o produtor quiser mencionar a casta no rótulo das garrafas, como acontece actualmente, não pode mencionar “Vinho Verde”. Tem de optar, em alternativa, por rotular “Vinho Regional Minho”, que não tem o mesmo valor comercial junto dos clientes nacionais e internacionais.

Melgaço questiona “transparência”

O presidente da Comissão de Viticultura da Região dos Vinhos Verdes (CVRVV), Manuel Pinheiro apontou num encontro com jornalistas que “o caminho certo é mudar a lei por acordo”, já que uma “imposição de Bruxelas não permitiria ir buscar contrapartidas para os dois lados”. “No dia 13 vamos fechar o acordo ou ficar de tal forma perto que será possível legislar. Mesmo que as percentagens sejam dissonantes – e este cenário é possível – enviaremos para o governo tudo especificado”, acrescentou o líder da comissão, que o Ministério da Agricultura mandatou para propor uma resolução para o diferendo e cujo conselho geral, que é o seu órgão máximo e deliberativo, já votou por duas vezes a favor deste alargamento.

Por outro lado, a batalha pelo “não” tem sido liderada pelas autarquias de Monção e de Melgaço, no Alto Minho. tendo esta última convocado já uma manifestação para o dia da última reunião do grupo de trabalho em frente à sede da CVRVV, no Porto. “Vamos demonstrar o desagrado. Achamos que devemos levar as pessoas a mostrar que a sub-região tem rostos e gente. E dissemos na última reunião com o Governo, em Outubro, de forma clara, que as autarquias estariam atentas ao evoluir da situação e, perante ela, guardariam o direito de intervir e fazer o que deve ser feito”, referiu o autarca, Manoel Batista.

Em declarações ao Negócios, o presidente da Câmara de Melgaço acusou a comissão de viticultura da região de falta de “transparência” neste processo. “

[Eles] estão a defender interesses económicos das grandes empresas e não os interesses da região nem os da sub-região de Monção e Melgaço, que nos últimos 30 anos assentaram a sua economia na produção de vinhos e na construção de uma região vínica forte. Há outros interesses e é o que nos faz ter esta atitude de luta forte. (…) Essa falta de clareza não faz sentido. A região ganharia com uma sub-região ainda mais forte e afirmada, não ganha com a banalização de um produto que ganhou uma notoriedade enorme”, criticou o autarca eleito pelo PS.

A produção deste vinho nos dois concelhos envolve a 60 produtores e dois mil viticultores, gerando um volume de negócio próximo dos 25 milhões de euros anuais. Para Manoel Batista, perante o pedido de esclarecimentos da Comissão Europeia, o Ministério da Agricultura deve responder que “esta é uma realidade estabelecida” e que esta exclusividade está prevista na legislação portuguesa desde 1973.

À excepção das Quintas de Melgaço, em que a autarquia é accionista maioritária (70%), os outros representantes da sub-região no grupo de trabalho – como a Adega de Monção, a Associação de Produtores de Alvarinho ou o produtor de referência, Anselmo Mendes – estão prestes a chegar a um entendimento com os interlocutores, entre os quais a Sogrape, a Aveleda ou a Quinta da Lixa. O autarca de Melgaço desvaloriza este facto e sustenta que “a defesa das autarquias não é tanto dos produtores do alvarinho, mas muito mais dos produtores de uva”, pois “a realidade no território é de pessoas com pequenas parcelas [de terra] que produzem uva alvarinha, paga muito acima da média”.

 

Fonte: Negócios

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