Mario Draghi admite que o primeiro plano de resgate a Chipre “não foi inteligente” e receia a degradação das condições de crédito para países periféricos como Portugal

Sinais de que a recuperação económica europeia pode estar em risco, agravamento das condições de financiamento bancário nas economias mais frágeis do euro depois do resgate a Chipre, ineficácia das medidas do Banco Central Europeu (BCE) para melhorar essas mesmas condições de crédito e ausência de pressão da inflação – o cenário para o BCE tentar agir com mais medidas de estímulo não podia ser mais claro e essa é a expectativa dos analistas depois da reunião de ontem do conselho de governadores.

“Vamos analisar os dados [sobre a economia do euro e o mercado de crédito] nas próximas semanas e estamos prontos para actuar”, afirmou Mario Draghi, presidente do BCE, em Frankfurt. “Estamos a considerar medidas convencionais e não convencionais e estamos a desenvolver uma visão de 360 graus nas medidas não convencionais”, acrescentou.

Uma nova descida da taxa directora – ontem deixada inalterada no mínimo recorde de 0,75% – não será a medida principal, embora seja considerada altamente provável pela maioria dos analistas sondados pelas agências noticiosas financeiras. A falta de eficácia das medidas mais convencionais de política monetária do BCE (descidas da taxa directora e concessão de liquidez não se traduzem numa melhoria significativa das condições de crédito no Sul da Europa) significa, contudo, que o banco terá de recorrer a soluções diferentes e mais arrojadas.

Draghi admitiu estar a considerar “vários instrumentos”, mas não deu qualquer pormenor. O BCE está a estudar medidas como o Funding for Lending Scheme, adoptado pelo Banco de Inglaterra, lançado em Agosto do ano passado para encorajar os bancos a dinamizarem o crédito às empresas.

Sejam quais forem os instrumentos a usar, o impacto na redução da fragmentação do mercado de crédito deverá ser curto. “Não penso que o efeito seja muito importante, como demonstra o exemplo de medidas semelhantes no Reino Unido”, afirma Paula Carvalho, economista do Banco BPI. Apesar do esquema do Banco de Inglaterra, os bancos continuam a reduzir o crédito à economia. “Um avanço na união bancária, por exemplo, que isolasse o risco dos bancos do risco do país em que estão seria um passo muito mais relevante”, acrescenta.

A fragmentação do mercado de crédito na zona euro – que significa que duas empresas iguais tenham acesso a financiamento a taxas de juro muito diferentes consoante o país em que estejam – é um dos principais obstáculos para economias periféricas como Portugal. Os bancos do país estão entre os da Grécia, Chipre e Itália como aqueles que praticam taxas de juro mais altas no crédito às empresas, um factor que ameaça as frágeis hipóteses de retoma, conclui um relatório publicado esta semana pela Comissão Europeia.

A fragmentação deve-se não só às fragilidades específicas do sector da banca nos países afectados (subida do crédito malparado e queda da rendibilidade), mas também ao risco do país de origem dos bancos, um factor intensificado com o resgate a Chipre. Draghi admitiu ontem que o plano inicial viabilizado pelo Eurogrupo e pelo BCE – que incluía uma violação indirecta da garantia de depósitos – “não foi muito inteligente”.

Fonte: Jornal i

 

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