A história da Bitcoin está, desde o início, envolta em mistério. O criador da moeda virtual é um ilustre desconhecido. Satoshi Nakamoto é o pseudónimo do pai do Bitcoin. Este nunca se revelou à comunidade tendo entretanto, de acordo com o site oficial (Bitcoin.org), “avançado para outros projetos”.

Contudo, a invenção que deixou para o mundo cresceu. Esta “criptomoeda” figura uma revolução monetária, já que é uma moeda apenas com “existência digital”, sendo que “não existe qualquer representação física”, funcionando “ num sistema bancário distribuído e não centralizado”, explica Isabel Matos, utilizadora da moeda.

Com esta moeda, é possível fazerem-se compras online – nomedamente através do site bitcoinstore.com – sendo que, como diz Jon Holmquist, do site weusecoins.com, tem a vantagem de não existirem “ intermediários que controlam a moeda, sendo que não há basicamente nenhuma taxa”. O site bitcoin.org explica todos os passos necessários para a criação de carteira e consequente adesão ao mundo das Bitcoin.

A tulipa do século XXI ou uma “moeda romântica”?
Apesar do entusiasmo em redor desta nova moeda, há quem seja cético em relação ao futuro da mesma. De acordo com o Financial Times, o valor da moeda tem aumentado de forma estrondosa. Se quando foi lançada valia 0,05 dólares, agora ultrapassa os 130 dólares. Em duas semanas, o preço chegou a duplicar.

O período de crise financeira, e a natural desconfiança no sistema bancário, estão relacionados com o aumento de popularidade do Bitcoin. Jon Holmquist, é da opinião de que “as pessoas estão à procura de alternativas para o sistema bancário corrupto e arcaico”.

O gestor de empresas João Caetano Dias, corrobora esta ideia: “Em tempos de Quantitative Easings, de pressões sobre o BCE para que este abra a torneira, de governos com orçamentos descontrolados, o Bitcoin surge como a moeda rebelde e honrada, a moeda sem dono, imune às impressoras e às crises. É uma moeda romântica”, diz.

Um voluntário da Bitcoin.org que escolheu o anonimato, resumiu esta ideia ao Dinheiro Vivo: “O Bitcoin não pode ser confiscado se se tiver o devido cuidado”.

Há, no entanto, quem olhe com desconfiança e ceticismo para esta moeda. O economista Nuno Teles refere que nos encontramos perante “um sistema de emissão de moeda privado, embora de carácter descentralizado, que procura replicar o que o ouro foi para a economia há décadas atrás”, sendo que há. “uma oferta de moeda muito limitada e, aparentemente, com um limite máximo a atingir daqui a uns anos” Assim, explica, “o valor da moeda é unicamente reflexo do jogo da procura e da oferta e, por isso, vulnerável à volatilidade, sem que haja uma autoridade com poder emissor que possa estabilizar o mercado (como acontece na presença de um banco central)”.

O problema, como explica Nuno Teles, é que “basta uma mudança de expectativas quanto ao futuro valor da moeda ou, neste caso, à segurança informática do sistema, para o valor da moeda colapsar, sem que haja qualquer mecanismo de estabilização”.

João Caetano Dias é mais otimista. O gestor de empresas relembra que “o Bitcoin já teve subidas e quedas bruscas”, referindo que “sendo a oferta conhecida e previsível, o preço é apenas determinado pela pressão da procura”. “Do mesmo modo que o interesse sobe, pode descer”, finaliza.

A questão da oferta limitada de Bitcoins prende-se, como explica Isabel Matos, com o desenho da moeda, que tem “como limite aproximadamente 21 milhões de bitcoin”. “É assim, uma moeda que tende a valorizar com o tempo e que desincentiva o seu gasto. É o contrário das moedas atuais, mas tem alguma semelhança com o ouro”, refere.

Nuno Teles, não vê, no entanto grandes vantagens nesta moeda. “Este sistema, ao contrário de outras moedas “alternativas”, não me parece ter qualquer vantagem – só os especuladores e quem se dedica a transações mais obscuras beneficia deste sistema”, diz. O economista explica que estamos perante “uma utopia anarco-capitalista”, atraente “pelo seu carácter descentralizado”, mas que incorre em riscos.

A pergunta que se impõe é: como reagirão os governos ao surgimento de uma tal moeda? Nuno Teles acredita que “sistemas destes estão condenados a prazo, pelas suas fragilidades internas ou pela necessidade de intervenção pública caso esquemas destes começassem a ter um peso na economia”.

Por seu lado, João Caetano Dias diz ser “pouco provável que o nível de confiança nestas moedas cresça ao ponto de as tornar mainstream, mas não deixa de ser um cenário teórico interessante, mas se tal chegasse a acontecer, os governos seriam rápidos a criar constrangimentos que o impedissem”.

Esta opinião é corroborada por Jim Angel, docente na McDonough School of Business da Univerdade de Georgetown, em declarações ao Financial Times.“Os governos não gostam de competição no negócio da moeda e se isto se tornar demasiado grande eles vão mandá-la abaixo”, antecipa.

O que é certo é que o negócio não para de crescer. Quem a vê como uma bolha diz estarem a ser trocadas tulipas em tempo real (em referência à bolha das tulipas nos Países Baixos do século XVI).

Quem é quem no negócio dos Bitcoins? 
De pequenos a grandes investidores, todos se parecem interessar pelo fenómeno dos Bitcoins. Segundo o Financial Times, há quem diga que recebe vinte chamadas por dia de grandes gestores de ativos que querem investir até 100 milhões de dólares, nesta moeda.

Mas não só de grandes gestores e investidores de ativos se faz o mundo das Bitcoin. Entre eles há idealistas, como Dário Luís, que além de “interessado pelo mundo da economia e mercados de valores”, se define como “anarquista”. Todavia, admite que “o primeiríssimo contacto foi desconfiado”, mas depois “a lógica de funcionamento do Bitcoin fez todo o sentido”. “Depois de me registar no fórum BitcoinTalk, ambientei-me bem e desde então que tenho seguido com atenção a evolução do conceito”, conta.

A perspetiva de Isabel Matos, também utilizadora de Bitcoins é semelhante. Isabel tomou contacto com a moeda em 2010, depois de um frenesim online, como ela própria descreve, “sobre uma moeda “livre de qualquer controlo governamental”, “Anónima”, e que podia ser minada (ou seja criada) pelo comum dos mortais”. No entanto, vê mais potencialidades para a moeda do que o simples idealismo.

Na opinião de Isabel Matos, “ao contrário da grande maioria dos anarquistas que as utilizam como forma de ir contra os governos/sistemas bancários, na minha opinião é uma tecnologia que pode e  deve ser estudada pelo sistema bancário e pelos governos/bancos centrais por ter a potencialidade de lhes trazer vantagens” e poderiam, nomeadamente “implementar internamente um sistema semelhante, isolado, para garantir por exemplo transações entre bancos, ou para facilitar o controlo de movimentações de capital dentro do próprio banco”.

Assim, a comunidade portuguesa adepta do Bitcoin está a aumentar. De acordo com André Perdigão, da equipa do Bitcoin-Portugal, não se notou tanta adesão no início, mas a “comunidade em Portugal está a crescer”, sendo que “existem algumas lojas online em Portugal que aceitam Bitcoins”, havendo contudo um longo caminho para percorrer.

André Perdigão realça que “algumas centenas de pessoas já ganharam fortunas com esta moeda, comprando e gerando as moedas a um preço baixíssimo para agora venderem a um preço exorbitante”.

Contudo, o universo das moedas virtuais não se esgota aqui e há já quem migre para outras moedas. Isabel e Dário são exemplos. A primeira, admite que já efetuou algumas transações com outra criptomoeda (Litecoin), dado que “ alguns investidores estão a começar a pensar adquirir Litecoins por serem mais baratas, e poderem ter no futuro um boom semelhante ao que vemos hoje”.

Já Dário acredita que o mundo das moedas virtuais não se deve reduzir ao Bitcoin. “Eventualmente pretendo investir em Litecoin, pois penso que há lugar para mais do que uma moeda virtual no mundo”, remata.

É seguro transacionar em Bitcoins?
Um dos grandes medos em relação ao Bitcoin e à sua eficiência prende-se com o facto das suas transações serem feitas online e, como tal, estarem sujeitas a roubo por parte de “hackers”. Para Jim Angel, docente na McDonough School of Business da Univerdade de Georgetown, o perigo é real. “Estamos a confiar em algoritmos para proteger o sistema, e todos sabemos que pode ir abaixo ou ser hackada. Estamos a um escândalo do Bitcoin colapsar”, disse ao Financial Times.

Utilizadores da moeda, como Jon Holmquist, admitem que esta pode ser roubada por hackers, realçando no entanto que “ há mais exemplos de roubos em cartões de créditos e de identidade (online) do que roubos de Bitcoins”. É, contudo, “ um caso a resolver nos anos vindouros”. “Espero inovações na segurança das carteiras de Bitcoin”, diz.

Quem tem experiência na lide com Bitcoins, aconselha cuidado na proteção do computador. Isabel Matos distingue dois tipos de ataques: os que acontecem a sites que lidam com Bitcoins e outros a contas pessoais. Os primeiros podem acontecer “praticamente com qualquer site que aceite cartões de crédito”, sendo que os segundos dependem do próprio utilizador. A utilizadora aconselha a encriptação da chave dada quando se inicia no mundo do Bitcoin.

Já Dário Luís, dá o seu próprio caso como exemplo. “Não me assusta, mas sem dúvida que tenho consciência dos perigos. Sempre tive especial atenção à segurança dos meus computadores, e agora mais ainda. Recorro também a sistemas de encriptação de ficheiros para salvaguardar a minha carteira virtual de Bitcoins de possíveis ataques”, diz.

André Perdigão crê também nos mecanismos de segurança entretanto implementados. “Desde que o Bitcoin foi lançado, muitos medidas de segurança foram implementadas, mais concretamente no cliente (software para gerir a carteira)”, referiu. Mas grande parte está na mão do utilizador: “Através de encriptação, um utilizador cifra a sua carteira com uma password deixando-a invulnerável ao roubo. Para empresas que trabalham com Bitcoins, é necessário que os seus servidores estejam protegidos para evitar ataques”, finaliza.

Fonte: Dinheiro Vivo

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