Sete anos depois do casamento nunca concretizado com o BCP, o BPI volta a ser alvo de uma OPA, desta vez do seu maior accionista, o grupo espanhol CaixaBank. A oferta está relacionada com uma outra tentativa de aquisição, a do Novo Banco.

A instituição catalã lançou na manhã desta terça-feira de Carnaval uma oferta pública de aquisição (OPA) sobre todas as acções que não detém no banco português por 1,329 euros por título.

A negociação dos papéis do BPI esteve suspensa pela CMVM até às 9h30 para que os investidores digerissem o anúncio preliminar. O banco regressou a disparar mais de 25% mas não superou ainda o preço oferecido pelo grupo espanhol. A forte pressão compradora contrasta com a queda do CaixaBank na bolsa de Madrid.

A contrapartida, a pagar em numerário, supera em 27% a cotação de véspera do BPI e um prémio de apenas 0,74% face à cotação média dos últimos seis meses, uma métrica muito utilizada para avaliar este tipo de operações. O preço alvo médio para os próximos 12 meses dos analistas que cobrem o BPI é de um euro por acção, segundo dados da Bloomberg.

A OPA avalia o BPI em 1,9 mil milhões de euros. Mas, uma vez que o grupo espanhol detém já 44,1% do capital, a aquisição de todas as acções remanescentes custaria mil milhões de euros.

Duas condições

A eficácia da oferta está dependente de duas condições: conseguir alcançar uma posição superior a 50% do capital e desblindar os estatutos de modo a anular o actual limite de exercício máximo de 20% dos direitos de voto em assembleia-geral.

A primeira condição significa conseguir pelo menos 5,9% dos títulos do BPI nas mãos de outros accionistas, o que representa um investimento de 114 milhões de euros.

A segunda condição só se concretizará mediante o voto favorável de 75% do capital presente numa assembleia-geral que o CaixaBank já prometeu convocar.

Por se tratar de uma maioria tão expressiva, e uma vez que o CaixaBank só poderá votar com 20%, a eficácia da OPA está muito dependente do segundo maior accionista do banco português: a empresária angolana Isabel dos Santos, que tem 18,6% do capital.

Em comunicado, o CaixaBank disse querer prolongar a sua parceria com o terceiro maior accionista do BPI, a seguradora Allianz, que controla 8,4% do capital. Mas não fez qualquer referência nem a Isabel dos Santos nem ao mercado angolano, onde o BPI controla o BFA e onde terá de reduzir a sua exposição devido a uma alteração na contabilização europeia de rácios de capital. O segundo maior accionista do BFA, banco que nos últimos anos contrariou a pressão sobre a actividade em Portugal, é a Unitel, de Isabel dos Santos.

A compra do BPI pelo CaixaBank depende da autorização do Banco Central Europeu e está a ser assessorada pelo Deutsche Bank e pela Uría Menéndez – Proença de Carvalho.

Novo Banco na mira

Foi o El País o único a antecipar, ontem a noite, o lançamento da OPA, confirmada às 6h00 (hora portuguesa). O jornal espanhol associava esta decisão do CaixaBank a uma outra aquisição em vista, a do Novo Banco.

O BPI é uma das 15 entidades que passaram à segunda fase do processo de venda do Novo Banco e, enquanto tal, terá de apresentar uma proposta não vinculativa até 20 de Março.

Haverá assim dois calendários a correr em paralelo. O CaixaBank prevê concretizar a compra do BPI até ao final do segundo trimestre, precisamente o período em que o Fundo de Resolução conta alienar a instituição criada a partir do Banco Espírito Santo (BES).

Os últimos dados conhecidos sugerem que, juntos, Novo Banco e BPI superariam a Caixa Geral de Depósitos, o maior banco do sistema, em termos de activo, de rede e de carteira de crédito, mas não na rubrica de depósitos.

O CaixaBank fez cinco aquisições desde 2010: Caixa Girona, Bankpyme, Banca Cívica, Banco de Valencia e o negócio do Barclays em Espanha.

BPI com um pé fora de bolsa

No anúncio preliminar o CaixaBank abre a porta a, no caso de conseguir mais de 90% das acções, avançar com uma oferta potestativa sobre o resto do capital e retirar o BPI de bolsa.

Algo que, a se concretizar, reduziria o PSI 20 a 17 cotadas, abaixo do número mínimo de 18, e agravaria a perda de influência do sector financeiro na bolsa portuguesa. Em menos de um ano, os representantes bancários cairiam de cinco para apenas dois – a saída do BPI somar-se-ia às exclusões do ESFG e do BES no ano passado.

Elogios a Ulrich

Tanto no anúncio preliminar, como no comunicado posterior, o grupo espanhol deixa palavras elogiosas para a actual gestão, sugerindo até a sua continuidade.

“O CaixaBank prevê continuar a apoiar a equipa directiva do BPI, cuja gestão conseguiu proteger o BPI da instabilidade que afectou o sistema financeiro durante os últimos anos. O CaixaBank confia que a actual equipa de gestão saberá aproveitar a recuperação económica de Portugal”, referiu o banco espanhol em comunicado.

O mandato da actual equipa, liderada por Fernando Ulrich, que substituiu Artur Santos Silva em 2003, termina em Dezembro de 2016. De acordo com os actuais estatutos, que impedem que alguém com mais de 62 anos assuma cargos executivos, este será o último triénio de Ulrich.

BPI em “inteira normalidade”

O BPI já reagiu à OPA espanhola. Em comunicado lembra que o CaixaBank é seu “accionista desde 1995, tendo mantido um apoio permanente à estratégia de crescimento e afirmação do Grupo BPI nos últimos 20 anos”.

Refere também que “prosseguirá sem alterações e com inteira normalidade o seu plano de actividades”, o que inclui a tentativa de absorver o Novo Banco.

Tal como previsto na lei, o conselho de administração do banco português tem oito dias, contados a partir da data em que receba os projectos de prospecto e de anúncio de lançamento, para se pronunciar sobre a oferta.

Grécia é um risco

Tal como é habitual, o anúncio preliminar alude ao artigo do Código dos Valores Mobiliários que abre a porta a uma modificação ou mesmo revogação da oferta “em caso de alteração imprevisível e substancial das circunstâncias”.

Embora nunca o refira explicitamente, a Grécia é uma dessas “circunstâncias”. O Caixabank define como um dos pressupostos da oferta que “não ocorra qualquer alteração substancial nos mercados financeiros susceptível de ter um impacto negativo na Oferta”. E isso inclui “qualquer declaração por parte de um Estado que integra a Zona Euro, de incumprimento, parcial ou total, de obrigações de reembolso de dívida”, “qualquer acordo de reestruturação de dívida por parte de um Estado da Zona Euro” e “o abandono da Zona Euro, por parte de um Estado nela integrado, independentemente de esse abandono ser ou não voluntários”.

Três cenários que circulam nos corredores de Bruxelas após dois Eurogrupo inconclusivos que colocaram a Grécia num novo impasse com consequências, nesta altura, imprevisíveis.

 

O regresso da consolidação

Em Janeiro de 2000 o BPI já tinha sido parte numa outra tentativa de consolidação, desta vez com um acordo de fusão assinado com o BES. Acordo que acaba por falhar, e nem chegar às assembleia-gerais dos dois bancos, depois do mal-estar gerado por Ricardo Salgado ter questionado publicamente a história e dimensão do BPI.

Pouco tempo depois, em Março de 2006, o BCP, na altura liderado por Paulo Teixeira Pinto, surpreendeu com uma OPA sobre o BPI, que o banco prontamente considerou hostil. Nem uma revisão em alta do preço salvou a oferta que ficará para sempre associada à luta de poder entre Teixeira Pinto e Jardim Gonçalves que culminou com a saída de ambos do BCP.

Apenas cinco meses depois desse falhanço, os dois bancos encetaram nova tentativa de aproximação, com uma oferta pública de troca. Uma proposta que chegou desta vez do lado do BPI e veio a ser recusada em final de Outubro desse mesmo ano, depois de o conselho de administração, na altura liderado por Filipe Pinhal, ter considerado que não criava valor suficiente. O Millennium bpi não chegou a nascer.

 

Fonte: Económico

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